David Vega | São muitas as razões que me levam a considerar que nosso país, o Brasil, tem uma enorme influência com a Hispanidade. No texto de hoje, te trago alguns exemplos, que talvez possas desconhecer e que gostaria de compartilhar contigo.
Todo o nosso mundo nasce do mesmo sítio: Na Península Ibérica. Somos filhos do Reino das Astúrias, do qual nos divorciamos quando se tornou o Reino de Leão, assim como fez outro filho, do qual Portugal é irmão: Castela.
Tanto Portugal como Castela adquiriram a herança de Leão, e quando não ficou nada desse reino, foi o momento em que os irmãos começaram a brigar.
Uma independência, uma descoberta e um império do comércio
Primeiro foi com Alfonso Henriques, que quis ser rei, para o que iniciou um processo de independência.
Anos depois, com dois reinos consolidados e uma crise sucessória, chega ao poder a Dinastia Avis (e o primeiro estado moderno da Europa), que traria a Portugal «a era das descobertas» e que impediu uma conquista castelhana de Portugal.
Os portugueses investem na sua expansão e seriam expoentes marítimos, com importantes descobertas como o de Pedro Alvares Cabral, que chega a Porto Seguro em 22 de abril de 1500.
No entanto, não só isso, como também se chegará ao Japão e se estabelecerão importantes rotas de comércio em toda a África, Índia, Indonésia e China.
Dessas lutas «dinásticas» e das descobertas da época, surge o nosso Brasil hispânico, especialmente depois da conquista imperial espanhola de Portugal e seus territórios ultramarinos.
Durante os reinados dos Felipes (II, III e IV), até em questões que permeiam o Brasil internacionalmente, ambientais principalmente, o primeiro registro de uma lei de preservação da natureza no nosso país, deu-se por um decreto de Felipe II em relação à derrubada predatória do pau Brasil (árvore símbolo hoje em extinção). Assim dá início esse Brasil hispânico que permeia nossa cultura atual.
A união ibérica e os holandeses
Não só no âmbito legal se deram influências, mas também fomos ajudados pelos espanhóis contra os holandeses, que pretendiam apropriar-se de nossas terras.
Sendo eles protestantes, invadiram o nordeste brasileiro, durante este período. O melhor desta história é que os espanhóis nos ajudaram, assim como os mestiços e juntos conseguimos expulsar o invasor Neerlandes em Guararapes.
Esta aliança liderada por Henrique Dias, foi um autêntico exército inter-racial, ao mais puro estilo «terço espanhol», os melhores soldados da época, e que era composto por paulistas, baianos e mazombos. Foi lá que nasceu nossa identidade como brasileiros. E foi graças à presença espanhola no Brasil.
E não quero esquecer de Diego Flores Valdés e sua fragata povoou e defendeu a costa brasileira. Os espanhóis lutaram pela posse de sesmarias.
As influências no Brasil hispânico
Como vês, são muitas as influências que recebemos do mundo hispânico, desde que se começa a configurar o Brasil, primeiro como posse portuguesa e depois como nação independente.
Desde Fernando de Magalhães, cuja expedição deu a Volta ao Mundo, da mão de Juan Sebastián Elcano, temos recebido essas influências, como por exemplo, o fato de que várias cidades brasileiras levam nomes de cidades espanholas; Cáceres, Catalão, Astorga, Toledo, Altamira e Filipéia, esta última homenageia Felipe II, hoje João Pessoa, capital da Paraíba.
E nas variantes lingüisticas também temos «doações» do galego como “Oh xente”, que virou “Oxente” na Bahia (em Salvador até hoje o termo “galego” é destinado às pessoas louras), o “Vixe Maria” do paulista e o “bueno” do gaúcho.
Em Salvador até hoje o termo “galego” é destinado às pessoas louras
E que me dizem do âmbito religioso. No Brasil temos padroeiras hispânicas como Guadalupe (a mesma que no México), Nossa Senhora do Pilar ou a Virgem da Candelária. Também personagens como o santo José de Anchieta, contribuíram para a evangelização do Brasil, sendo este de origem canária. A ele devemos a conservação da língua Tupi (língua geral em Piratininga e a Nheengatu, posteriormente falada na região da Amazônia), a qual, chegou a aprender e inclusive fez poemas e peças de teatro.
Mas sem dúvida, creio que são três os fatores que influenciaram a existência do país que temos: a promoção do comércio interno de escravos, a chegada da Coroa de João VI, após a invasão francesa da península ibérica e, sobretudo, o Tratado de Madri de 1750, que contribuiu para termos a extensão que temos hoje e que não sejamos pequenas repúblicas fragmentadas.
O Tratado de Madri de 1750 reconheceu praticamente o tamanho atual do Brasil
Na cultura, tenho que dizer que o nosso baile do forró, costumamos pensar que tem sua origem na metade do século XX, quando os norte-americanos instalaram sua base militar em Natal. E acreditamos que forró faz referência ao termo inglês de «For All», mas não é assim, porque novamente é a influência hispânica, já que o forró tem sua origem na dança popular do Forrobodó, cuja origem está na Galiza.
Os gaúchos, esses habitantes do Rio Grande do Sul e de países vizinhos, são uma resultante da cultura maragata, de León, mais precisamente de Astorga, com a guarani (o mate vem dos índios, mas o traje, a bombacha (vestimenta mourisca), o chapéu e o lenço, vem da vestimenta moura incorporada pelos espanhóis que emigraram para as regiões do Rio Grande do Sul, Paraguai, Uruguai e Argentina).
Embora existam várias teorias, o termo vem da palavra quéchua peruana “huacho”, que significa “solitário” – o pioneiro que cavalga nos pampas. Mas outras dizem que poderia ter origem no termo canário de «guanche» ou no andaluz morisco de «gacho».
Em todo o caso, tanto este como todos os outros exemplos constituem provas irrefutáveis de serem o resultado de um intercâmbio cultural incrível. Somos um Brasil hispânico.