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A epopeia do Bacalhau

4 de junio de 2020

Comemoram-se este ano, 500 anos da expedição de João Álvares Fagundes, aos bancos da Terra-Nova e Labrador

Se há algo que distingue os portugueses é indubitavelmente o seu gosto pelo bacalhau. Não é que a espécie em si, desperte alguma comiseração, simbologia ou tudo aquilo que pode estar associado com o ADN marítimo português. Mas a verdade, é que este país de dez milhões de habitantes, é responsável por praticamente 1/4 do consumo mundial deste “Gadus morhua”.

Não se pode porém afirmar inequivocamente, que a existência deste peixe em grande parte dos menus de restauração europeus se deve exclusivamente aos portugueses. Não, longe disso. Outros povos europeus desde sempre acorreram às águas frias e tempestuosas do Atlântico ou do Mar do Norte, para obter tão importante iguaria.

Carta de Pedro Reinel_1504 mostrando já a região actual da Nova-Escócia no Canadá como território Português

Mas sem dúvida que os portugueses fizeram com o bacalhau, aquilo que talvez saibam fazer melhor: da dificuldade e falta de recursos, obter o máximo rendimento. Não querendo entrar em pormenores metodológicos e gastronómicos, a sua salga e seca, saberes compilados durante gerações de pescadores inauditos, homens e mulheres rudes que religiosamente se dedicavam a esta arte, são sem dúvida fatores de diferenciação na forma de se apreciar tão vulgar quesito.

Os Portugueses corriam aos bancos da chamada “Terra-Nova”, bem a Norte, milhares de quilómetros da sua origem, em mares tempestuosos, onde o Atlântico é impiedoso com os homens e implacável com as embarcações, para de um modo quase rudimentar obter tão estratégico bem. Tinha mesmo que valer a pena para enfrentar um caminho tão dantesco.

Atlas Português de 1519 do Atlântico norte

E por entre tão intrépidos homens, um improvável navegador foi de suma importância para o estabelecimento de colónias piscatórias portuguesas no que são hoje as províncias da Nova-Escócia e da Terra-Nova e Labrador: João Álvares Fagundes. Nascido em meados do século XV em Viana do Castelo, partiu por sua contra e risco para em nome do reino de Portugal reconhecer esses territórios como seus.

Faz precisamente este ano 500 anos da sua expedição, momento destacado em monumento comemorativo na baía da cidade de Halifax, na Nova-Escócia Canadá e na sua cidade Natal em Portugal, aventura essa quase desconhecida, suplantada pela enorme epopeia da viagem de circum-navegação de Fernão de Magalhães1.

Monumento em Halifax – Canadá comemorativo da expedição com a inscrição “Portuguese Explorer * 1520 * Alvares Fagundes”

O que teria levado um homem a investir o seu próprio dinheiro em tão inaudita expedição? Seria o bacalhau um tesouro maior do que o ouro? Em Viana do Castelo, as duas tradições são igualmente importantes: a da transformação do ouro e a da seca do bacalhau, mas o que realmente fica na memória e no paladar, são as mil formas de se confecionar o bacalhau em Portugal. Esse sim, o nosso tesouro gastronómico.

1 Este também um Alto-Minhoto, nascido em 1480 em Ponte da Barca,  distrito de Viana do Castelo – Portugal.